O babywearing e a prematuridade - entrevista com Cristina Halpern
Cristina Halpern é Neuropediatra e especialista em diferentes áreas do desenvolvimento infantil, com destaque para a prematuridade, formando parte da equipa de consulta do bebé prematuro do CADIn.
Quando os bebés apresentam características especiais, o cuidado que pedem por parte dos seus pais e cuidadores é também ele, necessariamente, mais especial. Nesta conversa tentei perceber o que muda e como é que o babywearing pode ter um papel a desempenhar no desenvolvimento de todos os bebés, sobretudo dos que chegam antes de termo.
Para que fique claro para todas as famílias, como se define a prematuridade?
Um bebé é prematuro se nasce antes das 37 semanas de idade gestacional.
O babywearing é recomendado para bebés prematuros?
O “babywearing” que é um termo anglosaxónico agora muito em voga, refere-se a métodos de transporte dos bebés junto ao corpo dos pais ou dos principais cuidadores, usando vários tipos de panos ou mochilas. Não é mais que uma forma ancestral de cuidado dos bebés, presente em muitas culturas do mundo, mesmo geograficamente muito afastadas.
Tem assim um lado intuitivo e tradicional. O que atualmente se tem procurado é justificar esta prática com base na ciência, no estudo das relações precoces e no conhecimento do neurodesenvolvimento dos bebés. Para os bebés prematuros o “babywearing” é benéfico pois permite a implementação do “método canguru”.
O “método canguru” é uma forma de cuidado dos bebés prematuros que, por analogia com a bolsa marsupial, permite o contacto pele a pele mãe/pai-bebé por períodos muito prolongados do dia e durante as manipulações técnicas desconfortáveis e dolorosas para o bebé. O bebé costuma estar na posição vertical. O “método canguru” pode ser promovido assim que a estabilidade clínica dos bebés o permita, atendendo à vontade dos pais, e desde os primeiros dias de internamento nas Unidades de Cuidados Especiais aos Recém- Nascidos.
Que vantagens existem no colo de Sling a bebés prematuros?
Hoje em dia há estudos científicos que apontam para a vantagem deste contacto mantido e próximo mãe/pai - bebé - para os bebés (maior estabilidade e bem-estar), para os pais (saúde mental) e para a relação e interação pais/bebés.
Há cuidados especiais a ter ao dar colo de babywearing a bebés prematuros?
Os cuidados a ter na utilização destes métodos são sintetizados na regra inglesa T.I.C.K.S T. “Tight” - o material têxtil usado deve permitir uma posição estável, com o bebé posicionado na vertical, cabeça elevada e apoiada I. “In view all times” - a face do bebé deve estar sempre visível e descoberta C. “Close enough to kiss” - a cabeça do bebé deve estar perto da face do adulto, à distância de um beijinho K. “Keep chin off the chest” - o queixo do bebé deve estar sempre livre S “Supported back” - as costas do bebé devem estar sempre amparadas; o adulto, se mudar de posição deve amparar sempre o bebé para não cair.
E os bebés devem ser imediatamente retirados destes panos ou mochilas se estiverem mal posicionados, enrolados, com dificuldade em respirar, com um tom mais pálido ou azulado da pele ou se o bebé estiver irritado, inquieto ou gemicando. Como qualquer medida ou recomendação, o babywearing é apenas um meio que pode ser útil às famílias. Na minha perspetiva, maior é o pretexto que o babywearing nos traz para que possamos facilitar, promover e proteger a relação precoce mãe/pai - bebé, procurar conhecer as necessidades do bebé e os factores promotores da sua regulação, da co-regulação entre os pais e o bebé, e construir um sentimento de segurança, bem-estar e previsibilidade durante a primeira infância.
A proximidade à voz da mãe, ao bater do seu coração e respiração é importante?
Os bebés que nascem prematuramente interrompem precocemente o processo contínuo intra-uterino de exposição à voz materna. Nas Unidades estão ao mesmo tempo sobre expostos a ruído (embora o esforço de todas as equipas seja obviamente máximo ) e pouco expostos aos bons sons da voz materna. Assim, a perda da voz materna é talvez uma das grandes perdas do bebé prematuro. Durante o internamento nas unidades de cuidados intensivos, os bebés ouvem pouco um discurso materno ou paterno direto num contexto relacional focado na partilha de emoções. Estudos muito recentes têm vindo a demonstrar a importância da exposição muito precoce do bebé prematuro à voz da mãe. Estes bebés parecem particularmente sensíveis ao significado biológico e afetivo e à atração única que para eles é a voz da mãe. A revisão sistemática da importância do contacto vocal precoce para o bebé prematuro tem mostrado o seu impacto a curto e a longo prazo na vida destes bebés e destas famílias, favorecendo a relação e o neurodesenvolvimento. Uma das equipas mais envolvidas neste estudos é a de Manuela Filippa, investigadora que o Cadin tem o prazer de convidar para o nosso Seminário “O Cadin vai a Évora” e Workshop dedicado aos bebés prematuros, nos próximos dias 8 e 9 de novembro 2024.
Haver um colo mais duradouro pode ajudar ao desenvolvimento neurológico do bebé?
Não há melhor pergunta para terminar.
Se eu tivesse que escolher uma única medida promotora do neurodesenvolvimento dos bebés seria o colo - de todas as formas, sobretudo aquelas que cada díade preferir. O colo como facilitador da relação, porque é na relação que todos o bebés vão alicerçando as etapas fundamentais do desenvolvimento - o sentimento de bem-estar e segurança, de envolvimento mútuo, as primeiras trocas na interação que ajudam na regulação e mais tarde na apresentação do mundo exterior.
Sobre o Simpósio CADIn
O Simpósio Neurodesenvolvimento e Inclusão do CADIn tem data marcada para os dias 8 e 9 de novembro em Évora e é um evento incontornável para todos, “*profissionais da área da saúde e da educação, estudantes e famílias.”*
As inscrições estão abertas em https://cadin.net/formacao-simposio-evora/
*“O CADIn – Neurodesenvolvimento e Inclusão vai realizar nos próximos dias 8 e 9 de novembro um Simpósio na Cidade de Évora. Dentro do espirito e missão do CADIn de promover a inclusão social de pessoas com necessidades especiais, propomo-nos fazer uma jornada de divulgação e reflexão, aberta a todos, sobre alguns dos assuntos a que o CADIn procura dar resposta, desde os bebés prematuros, às dificuldades de aprendizagem e às perturbações do neurodesenvolvimento e suas manifestações ao longo da vida.*
Sobre Cristina Martins Halpern
Neuropediatra da Consulta de Desenvolvimento do CADIn, Consulta do bebé Prematuro e Programa CADIR
Diretora Clinica Adjunta do CADIn
Neuropediatra do Serviço de Neuropediatria do Hospital Dona Estefânia
Neuropediatra da Consulta de Desenvolvimento da Primeira Infância do Centro do Bebé
Membro Titular da Associação Portuguesa de Observação de Bebés - Método Bick
Formação Certificada no modelo DIR/Floortime – ICDL 2022
Formação na observação da relação mãe-bebé na família segundo o método Esther Bick da Sociedade Portuguesa de Psicanálise
Pediatra
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